350 câmeras prontas para registrar a possível reentrada do foguete chinês sobre o Brasil

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Essa semana muita gente se preocupou com a notícia de que um enorme foguete chinês estaria caindo de forma descontrolada na Terra. Estatisticamente, o risco de que algum detrito atinja pessoas ou cause algum dano em solo é muito pequeno, mas é certo que, ao retornar à nossa atmosfera, o estágio central do Longa Marcha 5B deve proporcionar um verdadeiro espetáculo celeste. E se isso ocorrer sobre o Brasil, cerca de 350 câmeras do Clima ao Vivo e da BRAMON estarão a postos para registrar esse espetáculo. (UPDATE: as últimas previsões descartam a possibilidade de reentrada sobre o Brasil)

Lançamento do foguete Longa Marcha 5B na China - Fonte: CSA / China

Lançamento do foguete Longa Marcha 5B na China – Fonte: CSA / ChinaÉ importante ressaltar que objetos são abandonados em órbita e reentram na atmosfera da Terra praticamente todos os dias. Recentemente tivemos o caso da reentrada do segundo estágio de um foguete Ariane 5 visto em várias cidades do Pará ao Ceará, e também um caso registrado no noroeste americano, da reentrada do segundo estágio do Falcon-9. Geralmente, esses objetos têm “apenas” algumas toneladas e são quase que completamente vaporizados durante a reentrada, restando apenas algumas partes mais resistentes. 

E é aí que começam as grandes diferenças: o estágio central do foguete chinês Longa Marcha 5B, que deve cair nesse final de semana, é uma peça enorme, com 33 metros de comprimento, 5 de diâmetro e cerca de 21 toneladas de massa. Bem maior e mais massivo que a grande maioria dos objetos que costumam reentrar nossa atmosfera.

Incidente nos anos 70

Até já houveram reentradas de objetos mais massivos. Em 1979, por exemplo, a Skylab, que foi a primeira estação espacial americana, reentrou de forma parcialmente descontrolada. A Skylab tinha mais de 70 toneladas e seus detritos se espalharam por uma enorme área do Oceano Índico e do Oeste da Austrália.

Destroços da Skylab que caíram na Austrália em 1979 - fonte: 17qq.com

Destroços da Skylab que caíram na Austrália em 1979 – fonte: 17qq.com

O incidente com a reentrada da Skylab foi algo tão preocupante e perigoso, que a partir dele, foram estabelecidos protocolos internacionais para evitar reentradas descontroladas de objetos com mais de 10 toneladas. Só que, aparentemente, a China, que é nova na exploração espacial, está ignorando as recomendações.

Longa Marcha 5B parece estar sem controle

Desde a Skylab, a maioria dos grandes foguetes enviados para o espaço tem uma reserva de combustível para executar uma manobra de deorbitação, que provoca a reentrada em um local seguro. Geralmente isso é feito imediatamente após o foguete cumprir sua missão, mas no caso do Longa Marcha 5B, essa manobra não foi realizada. 

Em uma conferência de imprensa realizada na última terça, Wang Jue, Comandante-em-Chefe da missão chinesa, informou que houveram algumas melhorias no foguete que colocou em órbita o primeiro módulo da nova Estação Espacial Chinesa. Entretanto, nada foi falado em relação à alguma possível manobra de reentrada do Longa Marcha 5B, e isso gerou desconfiança na comunidade internacional. 

Essa desconfiança foi agravada depois que observadores de satélites em vários países perceberam que o foguete está girando no espaço, o que indica que ele foi largado à deriva e deve cair de forma descontrolada na Terra. Só não sabemos onde, nem quando. Mas por que?

Porque o foguete deve reentrar na atmosfera

Para orbitar a Terra, qualquer objeto precisa viajar a uma velocidade de cerca de 27 mil quilômetros por hora, o que gera uma força centrífuga que compensa a atração gravitacional. Só que, após cumprir sua missão, o Longa Marcha 5B foi deixado em uma órbita baixa, atingindo cerca de 170 quilômetros de altitude em seu ponto mais próximo da superfície. Nessa altitude, existem partículas de gases atmosféricos em quantidade suficiente para produzir arrasto, e isso reduz a velocidade do foguete, fazendo com que, aos poucos, a gravidade prevaleça.

Quando um objeto atinge a velocidade orbital (v), a força centrífuga gerada compensa a atração gravitacional (a) e o objeto permanece em órbita da Terra

Quando um objeto atinge a velocidade orbital (v), a força centrífuga gerada compensa a atração gravitacional (a) e o objeto permanece em órbita da Terra

A cada órbita em torno da Terra, o arrasto reduz ainda mais a velocidade do foguete, como consequência, sua altitude diminui, o que faz o foguete atingir camadas ainda mais baixas e mais densas da atmosfera, que oferecem ainda mais resistência. É um caminho sem volta. Sua órbita vai deteriorando até ele atingir o ponto de ruptura, quando o calor intenso e a desaceleração mecânica fará com que o foguete se despedace e queime por algum tempo.

Previsões de reentrada

Em teoria, poderíamos calcular essa deterioração orbital e determinar o exato momento em que o objeto iniciaria sua reentrada. Entretanto, esses cálculos envolvem parâmetros que são de difícil determinação, como a rotação do foguete e o fluxo de partículas solares, que pode interferir na densidade dos gases na alta atmosfera. Por isso, apenas quando estamos nos aproximando do momento da reentrada é que as previsões se tornam mais precisas.

Inicialmente, só podíamos afirmar que o foguete cairia em algum local entre a latitude 41,5 Norte e 41,5 Sul, mas agora, com a proximidade da reentrada, já podemos calcular as faixas onde a reentrada pode ocorrer. E nas últimas e mais precisas previsões de reentrada, divulgadas na tarde de sábado (08), não há chances de que ela ocorra sobre o Brasil. A previsão de reentrada é no Oceano Índico, ao Sul da Austrália, às 23:38 desse sábado (08), com uma margem de erro de 2 horas. Durante esse período, o Longa Marcha 5B faz passagens sobre a América Central, Sul da Europa, Nordeste da África, Oriente Médio e Sul da Austrália. Não há nenhuma possibilidade que a reentrada ocorra em céus brasileiros.

Previsão de reentrada às 23:38 de sábado (08) sobre o Oceano Índico - Fonte: satview.org

Previsão de reentrada às 23:38 de sábado (08) sobre o Oceano Índico – Fonte: satview.org

Mesmo que caísse sobre o Brasil, não haveria muito o que se preocupar, porque algo entre 60 a 80% da massa do foguete, deve ser consumida durante a reentrada. E o pouco que sobrar, cairá completamente fragmentado e numa velocidade bem inferior à sua velocidade orbital. 

Processo de reentrada

O processo de reentrada começa entre 120 e 100 km de altitude. Nesse momento, a compressão dos gases atmosféricos à frente do foguete deve começar a formar uma bolha de plasma que brilha intensamente. O brilho vai aumentando gradativamente à medida que o objeto vai penetrando na atmosfera. Por volta de 80 km de altitude, o calor e a resistência do ar devem começar a despedaçar o foguete e cada pedaço deve formar uma “bola de fogo” distinta. 

Reentrada da nave ATV-1 - Fonte: NASA

Reentrada da nave ATV-1 – Fonte: NASA

A maior parte do foguete, entre 60 e 80%, deve ser completamente vaporizada antes de atingir 60 km de altitude. Os pedaços que resistirem, geralmente as peças de titânio, tanques de pressurização e carcaças sólidas do motor, devem seguir “queimando” por centenas, talvez milhares de quilômetros, até que a resistência atmosférica reduza significativamente sua velocidade. Os fragmentos que sobrarem devem se espalhar por uma faixa da superfície que pode se estender por até 1000 quilômetros, chegando ao solo com uma velocidade bem menor, e sem riscos de explosões (o que tiver que explodir, explode na reentrada). 

Onde pode cair

Considerando a inclinação da órbita do foguete, há uma chance de 73% de que a reentrada ocorra sobre o oceano e cerca de 62% de que nenhum de seus fragmentos atinjam o solo. Se eles caírem em terra, a probabilidade de atingirem uma pessoa ou causarem danos é extremamente pequena (na ordem de 1:5000), especialmente para o Hemisfério Sul, onde a densidade demográfica é bem menor que no Hemisfério Norte.

Área potencial de queda da Tiangong-1 (que pode se aplicar também no caso do Longa Marcha 5B). Do lado esquerdo a densidade demográfica média para a latitude. Do lado direito, a probabilidade de impacto em cada latitude.

Área potencial de queda da Tiangong-1 (que pode se aplicar também no caso do Longa Marcha 5B). Do lado esquerdo a densidade demográfica média para a latitude. Do lado direito, a probabilidade de impacto em cada latitude.

De olho no céu

Definitivamente, o processo de reentrada na atmosfera não deve ser muito confortável para o foguete. Mas é relativamente seguro, para nós em solo, e extremamente belo de se observar. Embora esse espetáculo não seja mais possível de se ver do Brasil, o Clima ao Vivo, a BRAMON, a Rede Brasileira de Observação de Meteoros e o Canal AstroNEOS, devem realizar uma transmissão ao vivo no momento previsto para reentrada, acompanhando em tempo real a posição do foguete no mapa e em câmeras ao vivo espalhadas pelo mundo, além de trazer uma série de informações sobre essa e outras reentradas. A transmissão está agendada para às 23h de sábado. Acompanhem.

 

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