Os cometas não são, necessariamente, visitantes de primeira viagem do sistema solar interno. Mas também, para alguns destes, não há garantia de retorno. Oriundos dos confins gelados, estes viajantes tem que percorrer grandes órbitas em seu mergulho ao Sol. Algumas, com duração de milhares de anos.
Dadas suas características de imprevisibilidade e comportamentos muito particulares, os cometas já foram considerados mensageiros agourentos. Estranhos e amaldiçoados. Misteriosos em essência. Incompreendidos pelos povos antigos, selaram os destinos de impérios e monarcas. Hipnotizaram gerações. Provocaram atração e medo.
Os caldeus surgem como o primeiro povo que se interessou em registrar mais acuradamente as ocorrências dos cometas. Esta antiga civilização já possuía anotações astronômicas três milênios antes de Cristo. Ainda na chamada Idade do Bronze. Viveram onde hoje é o território do Iraque. Foi Sêneca (4 a.C – 65 d.C) quem relatou que os caldeus eram muito interessados nestes objetos celestes e possuíam ideias avançadas sobre a natureza destes.
Astrônomos chineses também fizeram suas contribuições. Desenvolvendo o mais completo registro antigo de observações de cometas. Chegaram ao ponto de criar o primeiro catálogo destes objetos, o Mawangdui Silk Texts, como ficou conhecido. A Figura 1 mostra um fragmento do manuscrito Mawangdui.
Figura 1
Alguns filósofos gregos consumiram certo tempo especulando sobre a natureza dos cometas. Para alguns, deveriam ser como planetas. Para outros, eram apenas nuvens “incendiárias” ou fenômenos ópticos atmosféricos (algo como o que ocorria com o arco-íris). A visão de Aristóteles (384-322 a. C) sobre o que seriam os cometas acabou por prevalecer por quase 2000 anos.
Segundo Aristóteles, a Terra era o centro do Universo, com todos os demais corpos orbitando-a. Mas, a trajetória dos cometas não se encaixava no modelo aristotélico. Assim, o célebre filósofo sugeriu que as “exalações” da Terra produziam tais fenômenos. Infelizmente, ao classificar os cometas como eventos terrestres, foi aberta a porta para interpretações supersticiosas.
Sêneca acreditava que os cometas estavam algo mais para planetas do que para “exalações”. E escrevia que, no futuro, o entendimento surgiria após um maior número de observações.
Por toda a Idade Média, quase ninguém se aventurou rivalizar com as ideias centrais da mecânica de Aristóteles. Mas com o Renascimento, novas observações, registros e interpretações do Universo começaram a surgir.
Ainda no século XV, Paolo Toscanelli fez os primeiros estudos dedicados aos cometas, sistematizando o registro da posição das caudas, nebulosidade do núcleo e descrições gerais dos aspectos visuais. E no início do século XVI, foi percebido por Peter Apian e Girolamo Frascastoro que a cauda dos cometas sempre apontavam na direção oposta a do Sol.
Tycho Brahe teve uma maravilhosa oportunidade de investigar o grande cometa de 1577. Uma vez que este objeto era muito brilhante e possuía cauda maior que 20º no céu, poderia ser facilmente visto por qualquer pessoa.
Usando o conceito de paralaxe, Tycho percebeu que suas medidas, feitas a partir da Dinamarca, mostravam o cometa em posição diferente no céu, em relação a posição do mesmo objeto, medida por astrônomos através da Europa. E essa diferença havia se mostrado muito pequena. Pequena demais.
A implicação direta disso era que o cometa deveria estar mais distante do que a Lua. E de fato, após seus cálculos, o cometa de 1577 parecia estar numa posição do espaço quatro vezes mais distante que nosso satélite natural. Sendo assim, o cometa não seria um fenômeno atmosférico. Era, evidentemente, uma nova categoria de corpo celeste.
O Grande cometa de 1577
Esta informação também forçou a revisão do Modelo orbital de Tycho Brahe e permitiu que os astrônomos apontassem suas mentes para uma direção mais acertada em busca da verdadeira natureza destes misteriosos viajantes.
Estávamos a pegar impulso. O salto viria a seguir.
Cometas: uma breve história Parte II
Compilação e edição: Lauriston Trindade
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