O ANO DE 2017 foi um ano muito especial para a BRAMON. Além de um ano repleto de novas adesões ao grupo, foi um ano em que não faltaram conquistas. Só para lembrar as principais delas:
- Março – Registro do Gigantic Jet – pela primeira vez no Brasil este fenômeno foi registrado em vídeo. Com uma riqueza de detalhes impressionante, as imagens captadas pelo estudante de meteorologia Diego Rhamon rapidamente chamaram a atenção de todos no Brasil e no mundo.
- Março – Primeiros Radiantes descobertos por brasileiros – pouco tempo depois, recebemos da União Astronômica Internacional a confirmação das chuvas de meteoros Epsilon Gruids e August Caelids, as primeiras descobertas por brasileiros, fruto de um intenso trabalho de aprendizado e cálculos matemáticos.
- Junho – 23 Novos Radiantes Descobertos – a União Astronômica Internacional confirma, de uma só vez, 23 novos radiantes descobertos pela BRAMON.
- Setembro – Participação no IMC em Petnica – o maior e mais importante evento internacional sobre meteoros, a IMC recebeu Lauriston Trindade, que apresentou a BRAMON, seus trabalhos e suas descobertas. Tudo isso graças a uma mobilização nacional que levantou fundos para custear a viagem.
- Dezembro – Primeiro Registro de Impacto Lunar Confirmado feito a partir do Brasil – após a mobilização de uma campanha nacional para observação de impactos lunares, dois membros da BRAMON conseguiram, pela primeira vez na história, registrar e confirmar em vídeo um impacto de um meteoroide na Lua.
- No dia 21, a IAU validou e divulgou na página do Meteor Data Center, novos 74 radiantes propostos pela BRAMON e logo depois, no dia 29, mais 23, totalizando 97 novos radiantes aprovados em dezembro e 122 no ano de 2017. E isso não significava apenas mais novas descobertas, isso significava que está em curso uma verdadeira revolução no estudo de meteoros. E nessa revolução, o Brasil vem tendo um papel de destaque.
Eis que 2017 ainda reservava mais notícias boas. No apagar das luzes deste ano de sucesso, recebemos nova validação da IAU. Ultrapassamos a marca de novos radiantes descobertos.
Mas vamos detalhar como a “revolução” começou.
A REVOLUÇÃO
Na verdade, essa revolução se inicia com a crescente participação de astrônomos amadores no monitoramento e estudo dos meteoros. Essa tendência teve início há uns 20 anos atrás nos Estados Unidos, Japão e notadamente na Europa, onde diversas redes formadas por astrônomos amadores de vários países se uniram e formaram a Edmond.
No Brasil, esse movimento foi ensaiado durante alguns anos, mas só ganhou corpo com o surgimento da BRAMON há apenas 4 anos. Mas a adoção de métodos simples e equipamentos de baixo custo fez com que a BRAMON crescesse rapidamente tornando-se hoje uma das maiores redes de observação de meteoros do mundo.
Outro fator importante é a política de dados abertos adotados por grandes redes, inclusive a BRAMON. Com isso, os dados dos meteoros registrados por essas redes podem ser acessados facilmente e utilizados em outras pesquisas, desde que mantidos os devidos créditos.
Por último, a evolução da capacidade de processamento dos computadores atuais permite a avaliação de grande volume de dados, assim, cada meteoro registrado em vídeo nos 20 anos da história do videomonitoramento pode ser utilizado na busca de agrupamentos que caracterizam uma chuva de meteoros.
Juntando todos esses fatores ao trabalho de um time capacitado, com habilidades diversas e extremamente unido e nós temos todos os ingredientes para iniciar uma revolução.
No PRINCÍPIO…
No início de 2017, a BRAMON estava envolvida em um esforço para tentar validar matematicamente suas primeiras chuvas de meteoros. Havia sido percebido através de análise visual uma concentração de radiantes de meteoros na Constelação do Grou. Durante esse esforço, perceberam-se também outros possíveis agrupamentos, mas diante da complexidade dos cálculos e de uma certa inexperiência no assunto, enviamos e tivemos validadas nossas duas primeiras chuvas de meteoros.
Já durante esse primeiro esforço, ficou claro para nós a necessidade de se automatizar o processo de separação e validação dos possíveis candidatos a novos radiantes. Tínhamos também algumas boas ideias para busca pelos novos radiantes em nossa base, mas como todas as boas ideias, são apenas boas ideias, se ninguém as transformar em realidade.
Foi nesse momento que entrou para nosso grupo de pesquisa o Leonardo Amaral, e graças ao trabalho dele, toda essa história começou a se tornar realidade. E uma realidade que foi muito além das nossas melhores expectativas.
Utilizando algoritmos métodos de validação consagrados, foi criado um software capaz de analisar uma imensa base, reunindo dados das bases abertas de todo o mundo, e identificar os agrupamentos de meteoros com radiantes próximos. E através de uma análise mais detalhada, separar todos os meteoros com órbitas semelhantes e executar testes de validação para comprovar a nova chuva.
Em junho de 2017, tivemos os primeiros resultados dessa nova metodologia. O momento que chamamos de Brazilian Storm, a validação de 23 novos radiantes validados pela IAU, pode ter sido o início, de fato, dessa revolução.
Naquele momento, ainda entre nós, haviam muitos questionamentos. Algumas chuvas pareciam tão evidentes que nos perguntávamos: Será que isso tudo está certo? Como ninguém viu isso antes? O argumento era a matemática, os métodos já consagrados que estávamos usando, e uma frase que certa vez foi dita por Leonardo:
“Não existem meteoros esporádicos” Leonardo Amaral
Evidentemente isso não é um fato científico, nem devemos ter como máxima. Mas é um contraponto a um paradigma que talvez estivesse esperando para ser quebrado e, só assim, a busca por novos radiantes ganharia um novo combustível. A ciência é feita em cima de fatos, de dados e de experimentos. Mas as vezes, precisa de inspiração para se mover.
Foi preciso esperar até setembro para que todas essas dúvidas se transformassem em confiança. A calorosa recepção que o Lauriston teve em Petnica durante a Conferência Internacional de Meteoros e o feedback que tivemos da comunidade científica nos deram o aval e um enorme incentivo para nossos estudos. Uma frase de Regina Rudawska, resume o sentimento deles:
“Os radiantes de fato existem e todos sabiam que eles estavam lá. Mas não conseguíamos enxergá-los porque não se pode obter resultados novos usando métodos antigos” Regina Rudawska
O mais interessante é que Rudawska não se referia aos primeiros 25 radiantes que já estavam aprovados. Ela falava de um reporte de 75 novos radiantes que ela tinha em mãos. Havíamos enviado esse reporte em junho e ela e os demais membros do MDC ainda estava analisando.
E agora, neste dia 26 de dezembro, entendemos porque essa resposta demorou tanto. Em uma única atualização da base de dados da MDC foram incluídos 181 novos radiantes, e entre eles, 74 propostos pela BRAMON e outros 106 propostos por Peter Jenniskens, um dos maiores estudiosos da área.
E aí, quando todos achavam que o ano havia acabado, no momento em que eu escrevia esse texto, neste dia 29 de dezembro, eis que surgem na lista de radiantes da IAU novos 23 radiantes propostos pela BRAMON. Tratam-se de radiantes em que estamos trabalhando desde junho e submetemos agora em dezembro.
Entre esses radiantes aceitos no mês de dezembro, destaca-se o “27 Comae Berenicids”, que foi descoberto por Carlos Di Pietro a partir de uma pesquisa reversa. Já haviam alguns trabalhos sugerindo a existência de uma chuva de meteoros associada ao Meteorito Pribram que caiu na antiga Tchecoslováquia em 1959. Agora, utilizando essa incrível ferramenta desenvolvida pelo Leonardo Amaral, Di Pietro conseguiu isolar e validar 21 meteoros com órbita idêntica à órbita calculada para o meteorito Pribram, confirmando assim a existência de uma chuva de meteoros associada a ele.
Com todas essas descobertas, a BRAMON se consolida no estudo de vários campos da Ciência dos meteoros. Desde as primeiras proposições científicas, ainda feitas por Chladni, (século XVIII) até a inclusão de 122 chuvas de meteoros na lista oficial, houve diversas ramificações de entendimento e experimentação sobre os meteoros. O que a BRAMON fez não foi nada mais que reunir todo o cabedal de conhecimentos adquiridos por gerações de entusiastas e cientistas. Digerir e internalizar tais conhecimentos e transformá-los em um produto palpável e sólido, em contraste com a própria natureza de seus objetos de estudo: fugidios, efêmeros e transitórios.
[…] Em 2017, quando inaugurou seu observatório, chamado de Observatório Campos dos Amarais, ou simplesmente OCA, Amaral já havia instalado lá 3 câmeras de monitoramento de meteoros da BRAMON (Rede Brasileira de Observação de Meteoros). Mas as contribuições dele para a ciência de meteoros vão muito além das câmeras de monitoramento. Amaral participou da equipe de pesquisas de radiantes da BRAMON, onde desenvolveu um software que foi capaz de vasculhar uma base de dados de meteoros e encontrar mais de 100 novas chuvas, uma verdadeira revolução brasileira na área. […]